Franz Kafka - 1906
— Não sou acaso timoneiro? – exclamei. — Tu? – perguntou um homem alto e escuro, e passou as mãos pelos olhos, como se dissipasse um sonho. Eu estivera no timão em noites escuras, a lanterna ardendo fraca sobre a minha cabeça, e agora tinha vindo aquele homem e queria pôr-me de lado. E como eu não cedesse, pôs o pé sobre o meu peito e empurrou-me lentamente contra o solo, enquanto eu continuava sempre aferrado ao timão e o arrancava ao cair. Então o homem apoderou-se dele, o colocou em seu lugar e me deu um empurrão, afastando-me. Refiz-me depressa, contudo, fui até a escotilha que levava ao alojamento da tripulação, e gritei: — Tripulantes! Camaradas! Venham depressa! Um estranho tirou-me do timão! Chegaram lentamente, subindo pela escadinha, eram formas poderosas, oscilantes, cansadas. — Sou eu o timoneiro? – perguntei. Assentiram, porém apenas tinham olhares para o estranho, ao qual rodeavam em semicírculo, e quando com voz de mando ele disse: “Não me aborreçam”, reuniram-se, olharam-me assentindo com a cabeça e desceram outra vez a escadinha. Que povo é este? Pensa também, ou apenas se arrasta sem sentido sobre a terra?
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